Adotar sistemas de tratamento e reaproveitamento de água de reúso nos shoppings centers, aliados à conscientização dos clientes para reduzir o consumo, gera benefícios econômicos, ambientais e sociais aos empreendimentos

Por Instituto Akatu

Estamos vivendo períodos maiores de seca por todo o Brasil. A falta de chuvas que atinge o Norte e o Nordeste há quatro anos, e já é a maior seca dos últimos 50 anos na região, deve continuar em 2016, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). As boas notícias da volta das chuvas na região Sudeste, que estão reabastecendo timidamente reservatórios como o Sistema Cantareira, castigados pela seca desde o verão de 2013, serão acompanhadas de um aumento de temperatura na região, também segundo o Inpe.

As causas da falta d’água vão muito além do debate meteorológico. Envolvem a gestão de recursos hídricos das nossas cidades, pois é indispensável que a equação de atendimento de demanda, no contexto da oferta e produção de água, seja renovada. Devem ser buscadas também soluções mais imediatas de diminuição do desperdício na transmissão de água tratada – hoje com uma média nacional de 37% de perdas – além do esforço em maior escala no tratamento de esgoto e produção de água de reúso. Envolvem também os modelos de produção industrial e do agronegócio, que devem ser mais eficientes no uso deste recurso. E devem considerar, como ação que corrige parte das causas do problema, a recuperação da infraestrutura verde – florestas e vegetação em mananciais e nascentes – assim como a conscientização da população para diminuir o desperdício, enfrentando o desafio de mudar hábitos arraigados pela cultura da abundância de água.

Mas se há uma nova aprendizagem que essas últimas crises hídricas trouxeram é o reconhecimento de que o aquecimento global (causado pelo excesso de emissão de gases de efeito estufa na atmosfera por conta das atividades humanas, relativamente à absorção de carbono pela atmosfera) criou um cenário deimprevisibilidade sobre o clima. Não há mais como se basear, diante dessas mudanças climáticas extremas, em dados históricos de precipitação média para prever se estamos seguros ou não com as atuais reservas de água.

Diante da incerteza trazida pela mudança climática, os caminhos que a sustentabilidade nos apontam são de aproveitamento mais eficiente da água disponível, necessariamente envolvendo o tratamento de esgoto e o reaproveitamento de água de reúso e da chuva, e a diminuição do desperdício em todos os pontos da cadeia de consumo desse recurso natural.

Nesse cenário, a gestão dos shopping centers pode ter um papel protagonista e exemplar nas soluções para cidades mais resilientes e sustentáveis. Em meio à crise, conheça como shoppings centers de todo País vêm utilizando tecnologias e processos de reúso da água para evitar medidas emergenciais como a interrupção de serviços.

Água de reúso

O Plaza Shopping Tietê, em São Paulo, economiza cerca de R$ 300 mil por ano com o seu sistema de reúso de água, que atende a 50% da demanda do shopping (3.500 metros cúbicos por mês). Com exceção da água para beber, preparar alimentos e lavar as mãos, a água provém de reúso – como a usada na irrigação dos jardins e nas bacias sanitárias.

A construção e a operação do sistema de reúso do Plaza Shopping Tietê foi feito pela General Water, empresa que também é responsável pelo reaproveitamento da água em outros estabelecimentos como o Shopping Granja Viana, em Cotia (SP), e o Iguatemi Campinas (SP). Nessa relação, os shoppings pagam para a General Water uma tarifa por metro cúbico de água de reúso consumida. “Com isso, o estabelecimento reduz o consumo de água potável, reduz o descarte de esgoto no meio ambiente e reduz sua dependência da escassa água da concessionária, que pode ser oferecida para abastecer a população”, afirma Fernando de Barros Pereira, gerente comercial da General Water. Segundo ele, o shopping reutiliza cerca de 70% do esgoto gerado em suas dependências.

A água que iria para o esgoto passa por um processo de tratamento que leva até 12 horas. A água descartada é captada junto com dejetos, sabão e outros tipos de fluidos. Na estação de tratamento, ela primeiro passa por uma peneira, que faz a filtragem inicial dos resíduos. Em seguida, a água vai para os tanques de equalização, onde é feito o controle do volume de esgoto. A terceira etapa é a passagem por um reator biológico, onde bactérias se alimentam da matéria orgânica, limpando a água. O reator recebe uma injeção constante de ar, para que as bactérias que degradam o esgoto se proliferem.

A seguir, acontece o processamento no tanque de membranas de filtração, que separam completamente o iodo da água, que depois é esterilizada em outro tanque, com cloro. Enfim, a água fica pronta para ser reutilizada em algumas funções como abastecimento de torres de resfriamento de ar condicionado, bacias sanitárias e irrigação dos jardins.

Aproveitamento de águas pluviais

O Santana Parque Shopping, em São Paulo, coleta água de chuva, que é tratada junto com o esgoto do estabelecimento na estação de efluentes que fica no local. “Na estação de tratamento, a água passa por várias etapas de limpeza que eliminam até vírus e bactérias. Por isso, pode ser usada até para irrigação dos jardins”, explica Arthur Damásio, da Ecopolo, empresa responsável pelo sistema de reúso de água do empreendimento. Segundo ele, para os shoppings é interessante consumir a água de reúso gerada nas torres de resfriamento dos sistemas de ar condicionado – que no Santana Shopping responde por 50% da água de reúso, cerca de 1.000 metros cúbicos por mês.

A solução de reúso de água foi elaborada junto com o projeto do Shopping, inaugurado em 2007. A Ecopolo, responsável pelo investimento, construção e manutenção do sistema, cobra uma tarifa do shopping em função do volume de água de reúso consumida, com um contrato de pagamento mínimo de 1.000 metros cúbicos por mês. Com isso, obtém-se uma economia mensal de, aproximadamente, R$ 15 mil, segundo Carlos Santos, superintendente do Santana Parque Shopping.

Praticamente independente em relação à concessionária de água, o Santana Parque Shopping também consome água de dois poços (cerca de 4.000 metros cúbicos por mês) além dos 2.000 metros cúbicos de água de reúso por mês. A economia proporcionada pelos poços, segundo Santos, é de R$ 80 mil mensais. Extrair água dos poços dá independência aos estabelecimentos, que passam a não depender do fornecimento das concessionárias. Porém, é importante lembrar que água de poços artesianos também é um bem que deve ser consumido de forma consciente. Além disso, caso não se invista em infraestrutura verde, esses poços não serão recarregados e seu tempo de vida útil irá diminuir.

Sistemas economizadores

Em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, o Shopping Guararapes está na fase de implantação de um projeto de água de reúso. Atualmente, dos 110 metros cúbicos de água consumidos mensalmente, 40 metros cúbicos são de água de reúso, utilizada para a irrigação dos jardins. Nos próximos meses, eles aumentarão a capacidade para 90 metros cúbicos de água de reúso. “Nossa meta é, até o final de 2016, reusar 65% de toda a água consumida no shopping”, disse Kleber Silva, gerente de operações do Shopping Guararapes.

Para reduzir o consumo nos banheiros, o Shopping Guararapes instalou descargas com sistema a vácuo, que permitem uma significativa economia de água: o gasto é de 1,5 litro por descarga, enquanto os vasos sanitários tradicionais usam de 3 a 12 litros de água. E todas as torneiras e mictórios masculinos têm sensores para garantir que a água não será desperdiçada.

O Parque Shopping Belém, na capital do Pará, também adotou sensores de presença nos banheiros, que acionam e desligam as torneiras mais rapidamente. Mas o que realmente garante a economia é o aproveitamento da água da chuva, já que o índice pluviométrico é alto. “Temos o privilégio de ter chuva todos os dias. São 1.000 metros cúbicos de água da chuva por mês, que supre 40% da demanda do shopping”, diz o gerente de operações Andre Bittencourt. Segundo ele, a água da chuva ainda não é tratada, mas a empresa já começou um estudo para transformá-la em potável.

Por enquanto, o Parque Shopping Belém capta água de poços artesianos (2.500 metros cúbicos mensais) para uso em bebedouros e produção de alimentos nas praças de alimentação. “Não utilizamos a água da concessionária, que pode ser destinada à população. É uma questão de independência também. Se faltar água, por algum motivo, conseguimos gerenciar as fontes dos nossos recursos. O investimento que fizemos no sistema, depois de um tempo, se paga e se reflete em economia”, diz Bittencourt.

Engajar clientes e colaboradores

Uma gestão sustentável da água inclui, além de soluções estruturais, campanhas permanentes de conscientização para os clientes e colaboradores do shopping center, para que eles também colaborem no seu uso consciente. Mesmo que as tecnologias de redução de consumo, aproveitamento de outras fontes e água de reúso estejam nos bastidores “invisíveis” da gestão do empreendimento, há uma boa oportunidade delas serem comunicadas a todos de maneira a potencializar o engajamento das pessoas. Isso porque cada indivíduo, dentro do contexto coletivo de um shopping center que investe em soluções sustentáveis, pode se sentir mais estimulado a adotar, ele também, hábitos de consumo mais consciente em sua própria vida.

Um exemplo de campanha para colaboradores internos foi a “Maratona de Água” do Shopping Metrópole, em São Bernardo do Campo (SP), em que a loja que economizasse mais água em um período de seis meses receberia um prêmio em dinheiro a ser dividido entre os seus funcionários. Com esta e outras iniciativas, o Metrópole ganhou em setembro o Prêmio de Sustentabilidade Ambiental Uso Racional da Água da prefeitura de São Bernardo do Campo.

Já o Minas Shopping, em Belo Horizonte (MG), preparou uma campanha de conscientização sobre economia de água e energia para todos os seus clientes, além de uma programação de eventos. Em 2015, sua campanha foi veiculada em TV, rádio, jornais e internet. “O Minas Shopping é a extensão da casa dos nossos clientes e possui grande influência junto à sociedade; por isso, atitudes para evitar o desperdício devem estar presentes no dia a dia de todos”, afirma o gerente de Marketing do Minas Shopping, Christian Magalhães.

Matéria originalmente publicada na edição 204 da revista Shopping Centers, da Abrasce

Fonte: ABRASCE

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