A compra da rede de supermercados Whole Foods pela Amazon, anunciada na sexta-feira, não representou apenas um dos passos mais significativos na estratégia de expansão da companhia fundada por Jeff Bezos. Os US$ 13,7 bilhões que serão aplicados na operação foram um sinal inequívoco de que as barreiras entre o mundo digital e as operações tradicionais se desmancharam no ar.
Esses dois universos, que um dia foram caracterizados como tão distantes e até como rivais – com a internet pondo um fim ao que existia no mundo físico -, se tornaram, na verdade, indissociáveis, um amálgama que pouquíssimas empresas têm ideia de como tirar proveito. “As empresas que conseguirem ser ágeis e responder a esse mundo em constante transformação vão perseverar, deixando quem não conseguir pelo caminho”, disse Matteo Ceurvels, da empresa de pesquisa eMarketer. E a Amazon já provou fazer parte desse grupo.
Com as mais de 460 lojas do Whole Foods (que vendem, em média, US$ 663 mil por semana), a empresa de tecnologia e varejista ganha uma rede de distribuição gigantesca nos Estados Unidos. Sua capacidade de negociação com fornecedores também cresce exponencialmente, beneficiando compradores do site e das lojas físicas. Para Flávio Boan, diretor-executivo da consultoria Falconi, outro aspecto importante do negócio são os dados que podem ser coletados dos consumidores que frequentam as lojas. Combinadas com o que já se coleta no mundo on-line, essas informações darão à companhia um entendimento muito mais aprofundado dos perfis de compra de seus clientes, permitindo a criação de estratégias extremamente eficientes.
A Amazon vinha investindo gradativamente no setor de alimentos com o Amazon Fresh. O serviço de entrega de comida exclusivo para quem paga o Amazon Prime (serviço de assinatura que dá benefícios como descontos, entrega em um dia e acesso aos serviços de música e vídeo) que permite comprar pelo site e também retirar produtos em locais pré-determinados está em plena expansão nos EUA.
Há alguns meses, a companhia também apresentou a Amazon Go, uma loja-conceito que funciona sem caixas – o consumidor simplesmente pega o que deseja e sensores espalhados pelo espaço cuidam do resto.
Antes, ela tinha lançado o Amazon Dash, um pequeno dispositivo que permite encomendar produtos de uso recorrente como sabão em pó e fraldas apertando apenas um botão.
Para alguns analistas, o segmento de comida é a próxima grande fronteira a ser explorada pela gigante do comércio eletrônico, por isso, tem sido o catalisador da valorização das ações da companhia. No ano, a valorização está perto de 32%.
Após o anúncio da aquisição, o banco Nomura soltou um relatório aumentando o preço-alvo dos papéis da Amazon de US$ 975 para US$ 1,1 mil. “Em nossa visão, a Amazon tem condições de aumentar suas vendas um pouco mais rápido que o Walmart… e bem mais rápido que a Costco”, escreveu o analista Anthony DiClemente.
Assim como fez com a indústria dos livros, e com o varejo, a Amazon parece, agora, pronta para também dominar o setor de comida. E as redes tradicionais, que já vinham tentando, aos trancos e barrancos, se encaixar no mundo digital, terão que correr mais se quiserem se manter no páreo.
“As pessoas querem comprar quando elas querem do jeito que elas querem”, disse Francesco Losurdo, diretor de marketing da marca brasileira de móveis e acessórios Oppa, que começou com um site e hoje tem 15 lojas em oito estados. “O consumidor procura, sempre procurou experiência de compra, isso não muda. A grande chave é entender qual é essa experiência e colocar esse desejo dentro de uma estrutura corporativa. Senão, vocês está fora do mercado”, completou.