O modelo tradicional de varejo já sofre há anos o chamado “Apocalipse do Varejo” nos Estados Unidos, somando falência de incontáveis lojas físicas e abandono de shoppings centers. Para o Morgan Stanley, está chegando o momento de a América Latina passar por processo similar – e o Brasil deve ser o país mais afetado na região.
Em um relatório de 90 páginas, analistas do banco abordaram aspectos do movimento de “disrupção” do modelo atual de shoppings latino-americanos. De acordo com eles, diferentemente do que ocorreu nos EUA, a Amazon não será a principal “culpada”: por aqui, os aplicativos de entrega e de mobilidade urbana chegaram primeiro e causarão os maiores danos.

Com 60 milhões de downloads totais (e mais de 4 mil novos por mês), o uso de aplicativos como Rappi, Loggi e até iFood tem três “efeitos imediatos” na receita dos centros de compras da região, de acordo com os analistas. São eles:

Queda no tráfego de pedestres, especialmente para centros que possuem alimentação e supermercados
Restaurantes representam entre 10% e 20% das receitas totais com aluguel dos shoppings e entre 5% e 10% das receitas totais, diz o relatório.

Mesmo que as vendas subam com as entregas, o lucro desses restaurantes decairá se os shoppings continuarem cobrando porcentagens das vendas como taxa de ocupação, principalmente considerando que os apps cobram entre 20% e 30% dos restaurantes nas entregas. Isso tornaria vantajoso sair dos shoppings e montar restaurantes nas ruas.

A maior parte dos shoppings da América Latina tem nos estacionamentos entre 10% e 20% de suas receitas, diz o Morgan. “Acreditamos que os shoppings acabarão com menos vagas e preços mais altos, abrindo espaço para transformar os estacionamentos em centros de delivery. Isso deve diminuir a receita por metro quadrado, mas diminui os riscos”.

Os shoppings que devem sentir maior impacto de perdas nesta frente dentro da cobertura do Morgan são os da BR Malls, Iguatemi e Multiplan.

Aceleração da penetração do e-commerce à medida que a entrega passa a ser quase instantânea. “Resolver a questão do last mile [entrega] poderia ser um imenso catalisador para o e-commerce na América Latina”, escrevem os analistas, diminuindo a frequência nos shoppings.

Confiantes, mas de olhos abertos
Os empresários do setor parecem duvidar da chegada de um Apocalipse do Varejo por aqui, já que os shoppings do Brasil não têm o mesmo perfil dos Estados Unidos.

No ano passado, o CEO do Iguatemi, Carlos Jereissati Filho, disse ao InfoMoney que os dois diferenciais competitivos principais dos nossos centros de compras são a proximidade com os centros urbanos e a disponibilização de serviços, que os transformam também em áreas de lazer.

Mas confiança no modelo não significa estagnação. Cerca de metade dos shoppings ligados a grandes grupos já possuem iniciativas digitais, de marketplaces a disponibilização de espaços como pequenos centros de distribuição. O próprio Iguatemi já adiantou que seu shopping virtual deve estar no ar ainda neste ano e atender o país inteiro.

A Sonae Sierra, que tem no portfólio shoppings como o Plaza Sul, em São Paulo, anunciou recentemente que o Parque Dom Pedro, em Campinas, ganha um marketplace ainda neste ano. Depois, expandirá a outros endereços do grupo. A companhia também já tem parceria com a Rappi para atendimento em tempo real.

A CCP (Cyrela Commercial Properties), dona de shoppings como Cidade São Paulo, Shopping Metropolitano Barra e Tietê, lançou em 2017 o primeiro e-commerce da indústria, disponibilizado aos lojistas dos seus seis complexos de compras. O diferencial é o estímulo de aumento do tráfego de clientes, já que, por ora, todas as compras realizadas nos marketplaces devem ser obrigatoriamente retiradas nas lojas físicas. Esse formato agregou 5% às vendas até agora, com 300 lojistas participantes.

Ainda neste ano, a empresa pretende utilizar suas localizações privilegiadas para realizar entregas em domicílio. Pedidos em até 5 km de distância de um dos shoppings serão entregues em até meia hora.

Neste mês, a Multiplan investiu R$ 12 milhões para comprar 18,79% da Delivery Center, uma empresa de entregas que utiliza shoppings como centros de distribuição. A BRMalls também é sócia da startup.

Para o Morgan, aproveitar a localização privilegiada de novas formas é o caminho certo para os shoppings se blindarem da disrupção. Os analistas veem o uso da Área Bruta Locável (ABL, ou GLA na sigla em inglês) como um serviço como uma das principais saídas para os empreendimentos do varejo tradicional – justamente pela localização central.

Usar o espaço como serviço significa fornecer a localização física para aumentar a eficiência de outras empresas criando, por exemplo, mapas de calor (locais onde os clientes passam mais tempo em lojas); reconhecimento facial; integração com redes sociais; wifi inteligente (para captar hábitos e pesquisas) e modelos de estacionamento que possam fornecer informações sobre o tráfego de pedestres. “Focamos em tráfego a pé pelo simples fato de que isso movimenta os aluguéis”, explicam os analistas.

“Operadores de shoppings precisam investir em tecnologia, assumir responsabilidade pela geração de tráfego de pedestres e aumentar a produtividade aplicando inteligência ao ABL”, detalha o relatório. Para eles, o Brasil tem grande potencial no uso dos espaços desta maneira “graças ao número relativamente alto de lojas de pequeno porte e conteúdo local que pode se beneficiar de dados”, finaliza.

 

Fonte: Newtrade
Como os shoppings do Brasil podem se proteger do apocalipse do varejo
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