O presidente do GPA (grupo que controla redes como Pão de Açúcar, Casas Bahia e Ponto Frio), Peter Estermann convive com dois cenários opostos no seu dia a dia. Na sede do grupo – que faturou R$ 53,6 bilhões em 2018 –, na avenida Brigadeiro Luiz Antônio, comemora resultados das redes de supermercado. E ao menos dois dias por semana dá expediente em São Caetano do Sul, na varejista de eletroeletrônicos Via Varejo, cujo lucro caiu 79% até setembro em relação a 2017.
Em dezembro, Estermann passou a acumular a presidência da Via Varejo, dona da Casas Bahia e do Ponto Frio e controlada pelo GPA (do grupo francês Casino), a qual comandou entre 2015 e o início de 2018. O objetivo é recuperar receita e preparar a venda do controle da empresa. “Minha missão número um na Via Varejo é retomar o crescimento de vendas.” Ele acumula as duas funções de presidência até a venda da Via Varejo, o que deve ocorrer antes do fim do ano. Apesar dessa dualidade, ele se diz animado com o desempenho do negócio de supermercados e hipermercados, cujo lucro quase triplicou até setembro de 2018.
Otimista com as perspectivas da economia, o executivo não descarta a possibilidade de ampliar o investimento anunciado em dezembro, de R$ 1,8 bilhão para este ano. Mas condiciona essa revisão à aprovação das reformas, especialmente a da Previdência. “O primeiro semestre vai ser fundamental para validarmos as expectativas.”
Estão na agenda do GPA para 2019 fomentar o e-commerce, testar novos formatos de loja e apostar em meios de pagamento digitais. Peter Estermann diz que a meta é se manter na liderança da venda online de alimentos. “No e-commerce alimentar, o negócio tem de ser viável. A última linha (lucro) tem de ser positiva”, diz o executivo, que aponta o custo logístico brasileiro como principal desafio.
Para reduzir os custos, a companhia começou a entregar pedidos do e-commerce usando mercadorias de lojas próximas à casa dos consumidores. O modelo funciona atualmente em 70 lojas e a meta é mais que dobrar, para 150.
Também para driblar o desafio logístico, o GPA resolveu testar a transformação de um de seus hipermercados em um mini centro de distribuição. O projeto piloto na região do Morumbi, em São Paulo, pode servir para ajudar a empresa a expandir o e-commerce e viabilizar o avanço dos mercadinhos. As lojas de pequeno porte, abertas com as bandeiras Minimercado Extra e Minuto Pão de Açúcar, precisam de abastecimento frequente.
Ao mesmo tempo, a companhia se aproxima de startups e busca incrementar o uso de aplicativos. Em dezembro, o GPA comprou o aplicativo de entregas James Delivery, mirando ter seu próprio “super app”. A expressão ficou famosa por conta do sucesso na China de aplicativos como o We Chat, capazes de resolver diversos tipos de necessidade dos consumidores, de pedir comida a chamar um táxi ou fazer pagamentos.
Os esforços no mundo digital incluem a intenção de lançar uma plataforma própria de pagamento. Na Via Varejo, há planos para lançamento de uma carteira digital até o fim deste ano, projeto que resulta da parceria com a fintech AirFox.
O GPA acelerou os testes de novos formatos de loja. No momento, está também em fase piloto uma combinação de mercadinho com drogaria. A primeira loja fica no bairro da Mooca, em São Paulo.
Segundo o presidente Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, Eduardo Terra, a corrida do ouro do varejo online de alimentos está só começando. Ele calcula que o online é menos de 1% do varejo de alimentos como um todo. A seguir, trechos da entrevista.
Em dezembro, o sr. disse que 2019 seria um ano muito melhor. Mantém a expectativa?
Continuamos mais otimistas ainda, porque acreditamos nas reformas, especialmente da Previdência, e no crescimento do PIB na casa de 2,5%. Isso deve trazer mais investimento para o País. Devemos começar a ver uma melhoria no nível de emprego. Também houve melhora na confiança do consumidor. No GPA, percebemos uma evolução de tíquetes [ITALIC](valor médio das compras)[/ITALIC] muito positiva. Na Via Varejo, começamos a observar melhoria de fluxo na loja. Novembro e dezembro foram muito bons e continuamos bem em janeiro.
Com esse otimismo, o investimento de R$ 1,8 bilhão para 2019 poderá ser ampliado?
É muito cedo para mudar o nível de investimento. Se o cenário futuro for muito positivo, acreditamos que teremos um momento lá na frente para reavaliar. Continuamos com foco muito grande no ajuste, transformando supermercados Extra em Mercado Extra e Compre Bem. Os dois formatos estão indo extremamente bem. Estamos retomando o investimento no Pão de Açúcar. Retomando o crescimento do Minuto Pão de Açúcar (loja de vizinhança).
Essa expectativa positiva atual tem prazo para acabar?
Se o governo conseguir passar a reforma da Previdência, é um sinal importante de que as coisas vão andar. A segunda sinalização é ter uma visão clara da inflação, taxa de juros e retomada de investimento. A retomada de investimento começa a ter sinais claros. Primeiro semestre vai ser fundamental para validar as expectativas.
Foi uma surpresa para o mercado o sr. ter reassumido a Via Varejo. O que motivou isso e quais problemas o sr. espera sanar?
Minha missão número um na Via Varejo é retomar o crescimento de vendas. Não é nada diferente do desafio que tive quando fui para lá no passado. Tem algumas coisas que são fundamentais. A primeira é ter uma estratégia comercial agressiva. O caminho é sermos competitivos, trabalhar o mix de produtos que equilibre a margem da empresa. Temos de trazer o fornecedor para o nosso lado. Sentamos e montamos uma estratégia conjunta.
Isso significa conseguir descontos maiores?
Não é só desconto. Ele me apoia no fornecimento dos produtos. A transparência da sua estratégia vai fazer com que o fornecedor esteja mais próximo de você ou de mais alguém.
Esse alguém pode ser a Amazon?
A Amazon é um concorrente que tem de ser respeitado, mas acredito muito na estratégia da Via Varejo. Temos mil lojas, a melhor malha logística do País. Conhecemos todo o aspecto fiscal e tributário. Temos uma penetração com os fornecedores muito grande. Para a maioria dos fornecedores, nós somos muito importantes.
A Via Varejo espera chegar num alto nível de qualidade no atendimento, pelo qual a Amazon é reconhecida mundialmente?
Estamos integrando o físico e o online há apenas dois anos. Não vamos levar dez anos para fazer isso, mas não é em dois que se chega nesse nível. Não podemos passar de 2020.
O sr. continua nesses dois papéis, de presidente do GPA e da Via Varejo, até quando?
Pelo tempo necessário.
Até a venda do controle da Via Varejo?
Até a venda do controle, no mínimo. Até o fim do ano. Temos de fazer com que a Via Varejo retome o ritmo de crescimento. Nossas ações já valeram o que seria equivalente a R$ 9 a R$ 10 na visão de hoje (os papéis estão valendo pouco mais de R$ 5 na Bolsa). O meu objetivo é melhorar a companhia e trazê-la para um resultado que é bom. Se for bom para a companhia e as pessoas que estão lá, é bom para todo mundo, incluindo o acionista. Durante todo o tempo em que estive na Via Varejo, nunca foi combinado que eu teria a missão de gerar resultado para vender a companhia.